quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Numa noite fria

Longa história. Longa demais pra um único post

Parte I

Há muito tempo eu esqueci o que é sentir frio. Finalmente pude tirar minha jaqueta de couro do armário, justamente no mês em que paguei a ultima prestação. Ao passar pela orla fiquei olhando a revolta do mar que se debatia e se atirava contra a balaustrada. Os coqueiros envergados davam a sensação de iriam desabar a qualquer momento, assim como as sinaleiras e as placas de trânsitos. Gosto de caminhar e sentir a força do vento tentando me arrastar gosto de olhar a praia vazia. Tempo bom, podia ser sempre assim, sem o sol escaldante, sem a insuportável chuva, só o bom e velho vento assustando as pessoas e refrigerando a cidade.


Do alto do elevador Lacerda, sinto o vento bater na minha cara como um cachorro na janela do carro, enquanto espero uns amigos pra mais uma noite de bebedeira e perversão. Mentira! As pessoas vão chegando e se sentando até lotarmos um dos botecos do pelourinho, que já costuma ser deserto durante a noite, fica abandonado nesses dias frios. Lá pras tantas da madrugada já éramos a única luza acesa nas redondezas. Estavam comigo o Pedro, o Betão e o Lobo. Com eles estavam mais várias pessoas, amigos dos amigos e amigos dos amigos dos amigos. O Lobo era aquele cara popular, a maioria das pessoas estavam lá por causa dele, achavam-no o máximo e o tinham como o arquétipo do boêmio, mas na verdade ele não passava de um playboy que ainda morava com os pais e que sempre que as coisas fugiam um pouco do controle, corria do pau. Mas, ainda assim eu também gostava da sua companhia. Pedro era uma figura bastante excêntrica. Mais reservado do que eu, gostava de beber sozinho e de ficar em casa, só saia conosco por muita insistência. Já o Betão,esse sim. Esse era dos meus, a perfeita imagem do libertino, porém como todo porraloca que se preze quase sempre ele exagerava passava da conta. No bar, enquanto as pessoas conversam alto, todas querendo ser ouvidas, eu preferia me manter reservado daquele grupo de pessoas. Não eram meu mundo.


Enquanto isso o Betão já era o centro das atenções, todos aqueles burgueses amigos do Lobo ficaram encantados. Eu via aquela cena como pessoas assistindo a um chimpanzé na jaula. Preferi ficar com o Pedro no lado de fora do Bar. Enquanto fumávamos um cigarro ele me contava do seu livro de Poesias que tentava publicar. Eu já tinha lido alguns escritos, era de fato um ótimo poeta, mas ninguém se dava conta disso.


Enquanto estávamos lá fora, eu continuava a analisar o que acontecia dentro. O dono do bar que também era o garçom servia as pessoas com cara de poucos amigos. Imagino que deveria estar feliz por ser o único comerciante a ganhar dinheiro naquela noite, mas ele visivelmente não queria estar ali. Ao desfilar meu olhar novamente reparei algo que prendeu minha atenção: Uma negra linda, com um sorriso digno de propaganda de creme dental. Tinha seios fartos que eram empurrados pra cima por um decote generoso. Fiquei hipnotizado por um tempo, quando voltei em mim, reparei que nossos olhares se cruzaram, de inicio fugi, imaginei que ela estava me achando um tarado. Na verdade eu era, enquanto me perdia na imagem daqueles lindos seios, fantasiava mil perversões. Já meio sem graça continuei a disparar olhares bem mais contidos, e com o canto do olho percebi que sua expressão não era de reprovação, pelo contrario, ela me entorpecia com sorrisos. Continuei nesse flerte a distancia por certo tempo, por muito tempo, não tinha coragem o suficiente, e enquanto esperava o álcool fazer o seu papel de desinibidor continuava o papo com o Pedro.


-Quanto tempo você não vê a luz do sol?

-Não sei ao certo, porque essa pergunta, João?

-Man, você ta de uma palidez hospitalar. E essas olheiras, você não dorme?

-Que nada bicho, você sabe como são as coisas, prefiro ficar em casa, tenho trabalhado muito

-Trabalhado muito o caralho, você escreve uns textinhos de merda, praquelas revistas de merda

-Se fuder, tô terminando meu ultimo romance

-Puta que o pariu, mais um? Faz o seguinte me bota como seu herdeiro, quando você morrer vou ficar rico com seus royalties. Invento uma historia sobre sua morte, ai todos vão querer lê seus livros

-Muito confortante


Ao desenrolar da nossa conversa, Pedro levantou da cadeira e caminhou em direção a rua, ao mesmo tempo, a mulher com a qual eu flertava também levantou. Ela olhava em minha direção, estava com o vestido daqueles vão ate o chão. Ao ajeitar a cadeira por um momento ficou de costas pra mim e pude perceber que tinha um quadril digno de uma boa parideira. O pano fino do vestido delineou parte do seu corpo e eu já a imaginava nua.


Ela se vira, vem em minha direção, o seu sorriso vai ficando cada vez mais safado aumentando o meu tesão, enquanto ela desfila até mim eu levanto da cadeira com cara de bobo, olhando aquele quadril dançarino vindo até mim. Logo me aprumo, arrumo a postura, faço cara de galanteador, e ai ela passa por mim como se não me enxergasse. Primeiramente torço pra que ninguém tenha reparado, disfarço, volto pra cadeira e olho prá trás. E ela tá lá conversando com o Pedro, que não se mostrava nem um pouco surpreendido. E eu aqui achando que ia conseguir algo, o máximo que eu consigo é apreciar as suas costas enquanto se derrete pro meu amigo. É isso, vou ficar trancado em casa até parecer um moribundo pra vê se assim eu consigo uma mulher dessas.


Agora eu estou aqui, afogado em minhas frustrações, e mergulhando cada vez mais na cerveja. Vejo que na mesa em que estão as pessoas, existem muitas mulheres desacompanhadas, mas não me interessam, já estava fascinado pela aquela mulata. As horas vão passando, e assim como eu, o Betão parece decepcionado e vem ate mim:


-Você vai ficar ainda o resto da noite sentado ai sozinho com essa cara de cu?

-Eu? E quanto a você, senhor preciso de atenção?

-É o que? – Disse ele, num misto de espanto e dúvida

-Você não tava rodeado por todo mundo? Achei que ia sair com o Lobo e o resto da playboyzada

-Não – Um tom cabisbaixo- A criatura que eu achava que tava me dando mole, não queria nada
Soltei uma gargalhada daquelas em que você não se preocupa se está sendo ridículo rindo sozinho, enquanto comparava a desgraça alheia com a minha num ritual homeostásico.

-Pois bem- Falava enquanto me levantava da cadeira e puxava a carteira do bolso de trás- Tá na hora da noite começar

-Começar? Jã são 3 da manha?

-Até tu Betão? – Respondi com um espanto de descrença


E então outra gargalhada em alto e bom som, dessa vez começada pelo Betão e compartilhada por mim, como quem já entendeu tudo e não precisa mais de palavras.

To be continued

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Vinte e Sete

Eu insisto, mas o mundo me impede
Desse jeito não morro aos 27
Não que eu pense em desistir
Tampouco em me acomodar
Mas desse jeito eu sei que não vai da
Aos vinte e poucos e já
O Basquiat
O Cobain
A Janis e tudo mais
Já existiam como tais
E eu to ficando velho
Já vi que não da mais

Eu insisto, mas o mundo me impede
Desse jeito, não morro aos 27

Eu preciso aparecer
Já me cansei de crescer
Tenho q fazer algo de verdade
Que fique pra posteridade
Mas minha vidinha de merda insiste em me atrasar
Não sei se tem jeito vivendo no terceiro mundo
Ter que trabalhar e estudar
Mal tenho tempo pra respirar
Nem dormindo tenho tempo pra sonhar
Que porra posso fazer? Já vi q não vai da

Mas não vou me entristecer
Não posso parar
Eu vou encher a cara até aonde eu aguentar
Não vou mais dormir
Não vou descansar
Vou passar a minha vida numa mesa de bar
Só vou viver pra escrever e pra tocar
Já ta ficando tarde
Eu já tenho vinte e poucos
Espero conseguir viver ate aparecer
E se não der certo espero não me arrepender
Espero não me arrepender